O Flagelo do Desperdício Alimentar

O Flagelo do Desperdício Alimentar

 

Desde criança que sempre ouvi os meus pais e os meus avós dizer que deitar comida para o lixo era desgoverno. Talvez por isso mantenho este hábito de comer os restos que sobram das refeições dos miúdos e sempre que tenho de “limpar” o frigorífico para deitar comida fora, sinto uma dor aguda no coração.

Ainda hoje de manhã encontrei os meus filhos a preparar o pequeno-almoço para todos! Achei deliciosa a ideia e não lhes quis cortar a experiência, mas depois de tanta mistura de frutas, cereais, bolachas, sal e limão (!!!!) acabou tudo no lixo! E aqui senti mesmo um conflito interno imenso, porque rapidamente me apercebi do desfecho que ia ter aquela refeição. Por outro lado, senti que era importante eles chegarem à conclusão de que, se usassem menos ingredientes, conseguiriam um melhor resultado (“Less is more”)

O que é certo é que aqui em casa deitar comida para o lixo acontece, mais vezes do que gostaria. Também sei que quanto mais caótica for a semana, ou se no fim de semana não tiver um tempo e espaço para planeamento, pior será em termos de quantidade de comida que vai fora. Talvez aconteça o mesmo convosco.

Olhando para o mundo, um terço da comida que produzimos todos os anos acaba no lixo, seja das nossas próprias casas, das lojas, no seu transporte ou mesmo ainda na própria quinta.

As lojas, com maior evidência das grandes superfícies, têm feito um esforço para combater as perdas, através da sua transformação. Tendo as suas próprias cafetarias/restaurantes conseguem aproveitar os alimentos que já não conseguem vender, fazendo quiches, bolos ou mesmo refeições completas.

Mas a maior fatia de desperdício alimentar é feita por nós – cidadãos - nos nossos lares. 11% da comida que compramos não chega a ser consumida, enquanto quase 9% da população mundial passa fome. Não é preciso ser uma mente brilhante para perceber que algo de muito errado se passa aqui.

Além da própria comida que estamos a desperdiçar, temos de pensar que são gastos outros recursos, como água e energia, para a sua produção. 30% da energia consumida no mundo deve-se à produção de alimentos, que se traduz em 22% do total de emissões de gases de efeito de estufa. Ora quer isto dizer que, se 1/3 acaba no lixo, gastamos 10% de energia em vão e 7,3% de emissões de gases de efeitos de estufa são criadas para nada.

Porquê?

 

QUE MEDIDAS PODEMOS ADOTAR

- Nos centros de triagem de resíduos, já é comum aproveitar-se os restos de comida para a transformar em energia;

- A compostagem de bio resíduos das nossas casas e nas próprias quintas é uma excelente forma de valorização dos solos, e cada vez mais importante. Estou muito expectante e entusiasmada para ver a funcionar a recolha de bio resíduos em todos os municípios, com esta intenção de valorização dos solos;

- Em termos tecnológicos, a Tecnologia Verde tem e terá um papel muito importante:

- Os frigoríficos inteligentes que nos informam das validades dos produtos que têm lá dentro ajudam-nos no momento de fazer compras;

- Sistemas de painéis solares que preservam os alimentos dos vendedores das feiras e mercados;

- Projetos de economia circular a atuar junto das quintas de produção alimentar;

- Camadas protetoras líquidas e comestíveis nas cascas dos alimentos para durarem mais tempo.

São ideias incríveis já implementadas, mas que não chegam a toda a gente;

- Aplicações como a têm sido para mim uma companheira regular, mas espanta-me ver que ainda são poucos os espaços comerciais aderentes;

- Projetos como a ReFood, que resgata comida em bom estado dos supermercados e restaurantes, eliminando o desperdício e alimentando pessoas com dificuldades financeiras;

- Na Dinamarca, o movimento contra o desperdício alimentar é realmente importante e uma das medidas que adotaram foi o aumento dos preços dos alimentos. Pode parecer uma medida perversa do ponto de vista social, mas em termos de resultados estes têm sido positivos. 39% da população dinamarquesa faz um esforço para evitar o desperdício alimentar no seu dia a dia e 68% diz que ainda quer reduzir mais no futuro. Além disso, todos os anos conseguem ter dados que partilham com os cidadãos e isto envolve as pessoas e fá-las ter objetivos concretos;

De uma forma geral, estarmos atentos às inovações que vão surgindo à nossa volta, sermos interventivos e participativos na nossa comunidade, são das coisas que estão mais ao nosso alcance e em que mais facilmente nos podemos envolver.

 

METAS A ATINGIR

Se pensarmos que os nossos solos estão cada vez menos férteis pelas práticas de agricultura intensiva, a escassez de água é cada vez mais dramática, a sobrepesca e a degradação dos ambientes marinhos estão na ordem do dia, estamos a fragilizar os nossos recursos naturais para uma produção alimentar mais eficiente.

Se em 2050 chegarmos efetivamente a ser 9,6 mil milhões de pessoas em todo o mundo, serão necessários recursos naturais de 3 planetas para manter o nosso estilo de vida. Atualmente estamos longe de um sistema alimentar sustentável e resiliente e restam-nos apenas 8 anos para alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 12 das Nações Unidas, referente ao Consumo e Produção Responsáveis.

Pensar no consumo e na produção sustentáveis ​​consiste em fazer mais e melhor com menos. Mas passa também pelo aumento da eficiência dos recursos, promovendo estilos de vida sustentáveis, contribuindo substancialmente para o alívio da pobreza e a transição para economias verdes e de baixo carbono.

Sei que vamos lá chegar, mas a questão é quando o conseguiremos fazer.

 

Fontes:

https://ec.europa.eu/food/safety/food_waste/eu-food-loss-waste-prevention-hub/new/show/2396

https://www.fao.org/platform-food-loss-waste/en/

https://www.fao.org/international-day-awareness-food-loss-waste/en/