Perder uma espécie é perder Património - Lynx Pardinus

Perder uma espécie é perder Património - Lynx Pardinus

 

A propósito do Dia Mundial da Conservação da Vida Selvagem no próximo dia 4 de dezembro, faço um elogio ao Lince Ibérico.

Quando os meus filhos me perguntam qual o meu animal preferido, a minha resposta é, desde sempre, a mesma: o Lince. E, por isso mesmo, para eles é já um amigo que vêem muitas vezes em fotografias ou em ilustrações que temos lá por casa.

Não tive qualquer história com este animal, mas talvez por ver nascer em 2009 o Centro de Recuperação do Lince Ibérico, em Silves, terra do meu pai, e onde passo o verão desde criança, tenha feito crescer este afeto em mim. São animais incríveis, e não existem 2 iguais! Nunca consegui visitar este centro, e só bastante mais tarde percebi que as visitas ao centro de reprodução de Silves não são permitidas para evitar que os linces se habituem aos humanos e deixem de ter medo deles. E isto acontece para sua própria proteção, quando são libertados.

Acompanho todas as notícias acerca da recuperação desta espécie, e fico verdadeiramente satisfeita e orgulhosa por achar que se tem feito tudo bem para salvarmos o Lince da extinção certa.

Li recentemente a triste notícia acerca da Aura, a mais rabugenta lince ibérica que morreu, mas que deixou um rico legado da espécie com mais de 900 descendentes. A ela, um grande bem-haja.

Durante o século XX, a distribuição desta espécie quebrou muito, o que teve como consequência a redução e o desaparecimento de algumas das suas populações, ficando estas cada vez mais dispersas e afastadas. Esta quebra deveu-se essencialmente a:

• Diminuição do seu principal alimento, o coelho, resultado de doenças virais (mixomatose, febre hemorrágica), do abandono das práticas agrícolas tradicionais e de algumas práticas cinegéticas pouco adequadas;

• Perda e deterioração do seu habitat, os matagais e bosques Mediterrânicos, muito pela sua substituição por plantações de espécies florestais exóticas e/ou de crescimento rápido (ex. eucalipto, pinheiro-bravo), à construção de barragens e autoestradas, e aos recorrentes incêndios florestais;

• Outros fatores, como atropelamentos, abate intencional, doenças (ex. tuberculose bovina) e perturbação nas áreas de reprodução.

 

No início do século XXI, o Lince Ibérico era o felino mais ameaçado do planeta. Restavam menos de 100, e todos em Espanha.

A população de Lince Ibérico decresceu desde a década de 1950 e só começou a recuperar em 2004, quando a população na Península Ibérica subiu acima de 100 exemplares.

O ano de 2020 foi a primeira vez em que o número total de animais subiu acima de 1000. (Fonte: Expresso), o que é realmente impressionante.

Nos Censos de 2021, divulgado pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, os resultados mostram a presença de 1365 exemplares na Península Ibérica, sem contar com os linces que já nasceram em liberdade e são mais difíceis de contabilizar, por não serem monitorizados. Portugal tem 209 linces contabilizados.

Os critérios internacionais ditam que, para se atingir a autossustentabilidade do Lince Ibérico, é necessário chegar às 750 fêmeas reprodutoras territoriais. Segundo este último censo, a Península Ibérica tem 277 fêmeas reprodutoras.

 

Cooperação entre Portugal e Espanha

Nem sempre Portugal e Espanha estão de acordo, mas que bom é ver que conseguimos estar completamente alinhados num propósito.

A partir do momento em que os alertas foram dados pelas Organizações Internacionais de que o lince estava em risco de extinção, Portugal e Espanha uniram-se para trabalhar em conjunto para evitar este fim.

Percebendo que a reprodução em cativeiro seria a melhor forma de o fazer, foram criados centros específicos para este fim, trabalhou-se em conjunto em candidaturas a projetos europeus, incrementou-se a troca e a partilha de conhecimentos entre os centros de recuperação, e definiram-se estratégias de entrega ao seu habitat natural.

Estas 3 áreas de atuação têm sido fulcrais para esta missão de sucesso:

A articulação estreita com as entidades científicas e os técnicos do ICNF, de forma a desenvolver planos de ordenamento do território das áreas protegidas;

O financiamento comunitário;

O envolvimento das comunidades locais, autarquias, associações de caça e ONG’s

Trabalhar em conjunto nos projetos LIFE tem sido uma parceria muito bem-sucedida para Portugal e Espanha, e que devemos congratular.

O processo de reintrodução de linces em meio selvagem iniciou-se em 2014, com o primeiro casal a ser solto numa propriedade em Mértola, no Vale do Guadiana (Alentejo) - Jacarandá e Katmandu. Nunca mais me esqueci destes nomes. Esta zona foi a escolhida por ser rica em coelho bravo, e quando são soltos, todos os animais são monitorizados por coleiras GPS.

No início deste ano, a ONU elegeu o Lince Ibérico como símbolo do renascimento, afastando-se cada vez mais do perigo de extinção. Segundo o ICNF, “há 20 anos só existiam 94 linces ibéricos”, mas “um programa de recuperação permitiu que o número de linces ibéricos subisse para mais de 1100, mostrando assim o poder da conservação” na natureza.

Com as alterações climáticas e o aumento das temperaturas globais, enfrentaremos certamente outro grande desafio para esta espécie, mas olhando para trás só podemos parabenizar todas as entidades que estiveram ou estão presentes nesta missão.